A Previdência Social — assim designada primeiramente na CF/46 — constitui, stricto sensu, um sistema de seguro público formado por contribuições obrigatórias para cobrir: invalidez, velhice, doença, morte, encargos da maternidade. Suas fontes de custeio, estabelecidas desde a CF/34, provinham de “contribuição igual da União, do empregador e do empregado”. Como então a correlação era de sete segurados em atividade para um inativo, o sistema pôde ostentar, nas primeiras décadas, quadro financeiro saudável, superavitário. Com o tempo, a União, que já recolhia irregularmente suas contribuições, não somente cessou de fazê-lo, como ainda desviou enormes recursos do sistema para o auxílio à construção de grandes obras, tais como Ponte Rio-Niterói e Transamazônica, e para a amortização dos juros da dívida pública. Em março de 1995, o então ministro da Previdência, Reinhold Stephanes, revelou que o governo de Juscelino Kubitschek desviara entre R$ 20 e R$ 30 bilhões da Previdência para a edificação de Brasília.
Nossa legislação concedia aposentadoria, sem lime de idade, com 30 anos de serviço para mulher e 35 para homens. Esse tipo de aposentadoria — o mais cobiçado e gravoso benefício —, inexistente mesmo em países desenvolvidos, premiou centenas de milhares de trabalhadores de meia idade, no vigor de suas forças e capacidade. Também conhecida como aposentadoria ordinária, só veio a ser extinta, e com efeitos a médio e longo prazo, pela EC 20/98. Aos por ela beneficiados permitia-se ainda acumular o seu rendimento com o de outras aposentadorias, auferidos em atividade diversa, ou seja, uma dupla ou tripla aposentadoria, acrescida da remuneração de um eventual novo emprego. Freqüentemente, segurados inativos ganhavam mais do que os em atividade. Mesmo assim, em 1966, ao sair do Ministério do Trabalho e Previdência, Arnaldo Sussekind informava existir um superávit de 153 bilhões de cruzeiros.
Para aceleração do desequilíbrio financeiro do sistema concorreram o alongamento da expectativa de vida e a implantação do FGTS, o qual imprimiu rotatividade ao emprego, com a conseqüente massa de trabalhadores atirados à informalidade. Com a assunção (pelo Inampos) da assistência médico-hospitalar, propiciadora de fraudes vultosas, verificou-se brutal elevação dos gastos da Previdência. Isso, para não falar no regime de benefício previdenciário privilegiado dos servidores públicos, particularmente de magistrados (aposentadoria) e militares (reforma), pertencentes a um regime previdenciário próprio. Nomeavam-se, então, ministros do STF e de tribunais superiores, mesmo com mais de 65 anos, os quais, pouco depois, aos 70 anos, aposentavam-se compulsoriamente com vencimentos integrais.
A agravar a situação da Previdência havia, e ainda há, a gigantesca dívida de muitos milhares de empresas, decorrente do fechamento, atraso ou cessação de contribuições, inadimplência imputável, em grande parte, à incúria, à deficiência de fiscalização, leniência na cobrança dos débitos, a favorecimentos políticos. Mais de 70% desses créditos são irrecuperáveis, porque as empresas devedoras faliram, extinguiram-se, tornaram-se inativas ou desapareceram e, das restantes, milhares parcelaram seus débitos para pagamento em 15 ou 20 anos. Some-se a isso o pesado passivo dos débitos decorrentes de sentenças judiciais. As nomeações dos dirigentes da Previdência, ditadas por critérios políticos, respondem em grande parte pelo empreguismo anterior a 1988, desacertos, desfalques, má administração. A despesa do INSS em 1988 era de 2,5% do PIB e de mais de 7,5% do PIB, hoje. Celebravam-se na Justiça do Trabalho acordos em que o empregado abria mão do vínculo empregatício em troca de indenização, isentando-se o empregador das contribuições previdenciárias.
Mas foi a CF/88 que, embora com a melhor das intenções, ao conferir à Previdência atribuições de assistência social e assistência à saúde, próprios da Seguridade Social, acabou de levar o sistema a uma crise aguda. Entre as inovações, destaque-se a concessão de “um salário mínimo mensal á pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família”, sem a contrapartida da contribuição previdenciária. Esses trabalhadores urbanos, juntos com os rurais, aquinhoados também com vantagens, representam quase metade dos beneficiários do sistema.
As renúncias fiscais, muito utilizadas de algumas décadas para cá, têm contribuído sensivelmente para a queda da arrecadação previdenciária. A desoneração das cotas previdenciárias beneficiou também entidades filantrópicas. Devido a isenções — relatou, em 2002, o ministro do TCU Walton Alencar Rodrigues —, o sistema previdenciário deixou de arrecadar R& 10 bilhões. Com o fim de salvar a Previdência do colapso para o qual caminha, urge alargar sua receita e promover profunda, radical e audaz reestruturação.
É notório que o popular jogo do bicho utiliza no país, na informalidade, imensa mão-de-obra. Trata-se de uma atividade, posto que considerada contravenção — e injustamente, mesmo porque pululam no Brasil loterias e outras jogos —, está virtualmente institucionalizada. Manter, hipocritamente, esse jogo como prática ilícita, só interessa à polícia e a políticos corruptos, que dele se beneficiam, e aos banqueiros, que o mantêm e se apropriam de todo o lucro. Sua legalização, atraindo todos quantos nele se ocupam para a formalidade, além de ser medida contra a corrupção, reduzirá a violência, dada a sua promiscuidade com o crime organizado. A medida ampliaria substancialmente o rol de contribuintes da Previdência. Em vez de ir para o bolso dos banqueiros e para a corrupção, o rendimento do jogo, uma vez oficializado, seria canalizado para os cofres da Previdência. Há, ainda, que Implementar a taxação das “grandes fortunas”, como dispõe o art. 153, VII, da CF, e destinar o produto financeiro desse imposto aos cofres da Previdência, estendendo-se a medida às heranças de vulto. Propomos mais, sem prejuízo, de outras medidas: a) separar a previdência social da assistência social e da assistência à saúde, com o que o financiamento de uma e outra passariam ao Ministério da Assistência Social e ao Ministério da Saúde, respectivamente; b) extinguir o poder patronal de despedida arbitrária, fomentadora da rotatividade e do desemprego, redutores da arrecadação previdenciária; c) entregar o Ministério e a gestão da Previdência a técnicos, alijando-os de influência política; d) punir, efetivamente, como crimes de apropriação indébita, como manda a lei, os empresários que descontam, mas não recolhem as contribuições do trabalhador; e) cobrar com firmeza, sem contemplação, as imensas dívidas ativas dos empresários que possuam patrimônio; f) aumentar e tornar rigorosa a fiscalização e o controle das fraudes, responsabilizando criminalmente, sem delonga, seus autores, mediante reforma processual, de maneira a permitir a pronta recuperação dos valores desviados; g) responsabilizar efetivamente e tornar severa a penalidade para governantes que utilizarem recursos previdenciários em fins estranhos à finalidade do sistema; h) tornar opcional, com vencimentos integrais, a aposentadoria do servidor público, inclusive magistrados, aos 70 anos de idade e compulsória aos 75; i) abolir o privilégio da aposentadoria precoce (reforma) dos militares; j) uniformizar, dando tratamento igual e idênticos requisitos, à aposentadoria de mulheres e homens;
Com o acréscimo de arrecadação de contribuições decorrente da adoção dessas medidas, será possível restabelecer o poder aquisitivo das aposentadorias e pensões, de maneira a voltarem a corresponder ao número de salários mínimos da época de sua concessão. Há quem sustente, que, se se considerar as receitas alocadas à Previdência provenientes da Confins, CPMF, CSLL e dos concursos de prognósticos, como previsto na CF/88, o sistema é superavitário. Não fora a sucessão de vícios, distorções, desvios, fraudes, concessões de benefícios sem fontes de custeio, ampliação dos encargos do sistema para nele incluir atribuições da seguridade social, aí sim, teriam razão os que perfilham tal entendimento. Mas com os fatos retro expostos, seria um milagre estivessem as finanças da Previdência equilibradas. Todavia, como todos os males apontados são passados e consumados, o de que se trata agora é de planejar e assegurar o reequilíbrio, a solidez, a sobrevivência, o futuro da Previdência. E isso não se alcançará sem uma funda, cabal, corajosa, radical mudança. Mas como toda mudança encontra oposição e resistência daqueles que têm interesses contrariados, é preciso sensibilizar os poderes públicos, mobilizar e conscientizar a sociedade, fatores que demandam determinação e tempo.
Fonte:(Correio Braziliense – Benedito Calheiros Bonfim, Academia Nacional de Direito do Trabalho, ex-presidente do Instituto dos Advogados Brasileiros)
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