Os fundos de pensão são o maior instrumento de poupança voluntária no mundo, sendo que os seus ativos superam a casa dos US$ 20 trilhões. Constituídos para a complementação de aposentadorias, eles exercem um papel preponderante na riqueza dos trabalhadores e na formação de poupança interna.
Nas economias desenvolvidas, o valor dos seus ativos representa cerca de 70 a 120% do PIB dos respectivos países.
A essência do funcionamento de um fundo de pensão consiste em captar recursos dos participantes e das empresas a que são filiados (chamadas de patrocinadoras) para investi-los em uma gama de ativos financeiros de forma diversificada, com o objetivo de prover aposentadorias e pensões aos seus membros. A diversificação é muitas vezes imposição do supervisor, por meio da instituição de vários tipos de restrições a instrumentos ou classes de ativos, com a finalidade de garantir a solvência dos fundos de pensão, evitando que os mesmos incorram em riscos excessivos. Infelizmente, esses tipos de restrições são pouco eficientes e não são efetivos em limitar o risco incorrido, além de trazerem outras desvantagens.
Os fundos de pensão diferem dos fundos de investimento pela sua natureza. Nestes, a estratégia de investimentos é ditada pelo perfil de investimentos, que pode ser mais conservador, restrito a alguns ativos, limitado quantitativamente em cada classe de ativo etc. Os fundos de investimento têm um objetivo de rentabilidade bem definido – por exemplo, acompanhar a variação de um índice de mercado (conhecido como benchmark), buscar oportunidades de investimento no mercado acionário, e assim por diante, sempre tendo como foco maximizar a sua rentabilidade face às restrições do perfil de risco estabelecidas na política do fundo.
A verdadeira natureza de um fundo de pensão não consiste em otimizar a rentabilidade da sua carteira, mas sim promover todos os esforços para que as obrigações referentes ao pagamento das aposentadorias e das pensões aos seus membros sejam rigorosamente cumpridas. Por outro lado, essas obrigações não são determinísticas e nem estáticas. Elas são em certo sentido tanto aleatórias como dinâmicas, podendo variar bastante ao longo do tempo, e isso devido a vários fatores distintos. Alguns destes fatores são de caráter estocástico, como o risco de longevidade, que reflete a incerteza sobre o tempo futuro de vida dos elementos de uma dada população. Como conseqüência, a determinação dos fluxos de caixa das obrigações futuras de um fundo de pensão é tarefa bastante complexa, ainda mais se lembrarmos que elas podem se estender por um período superior a 50 anos. Os gestores dos fundos de pensão podem aplicar seus recursos em fundos de investimentos (abertos ou fechados) para rentabilizar sua carteira, de forma a gerar recursos para o pagamento de suas obrigações no futuro.
No Brasil, os fundos de pensão experimentaram nos últimos anos um crescimento do valor de suas carteiras devido ao bom desempenho do mercado de capitais e das elevadas taxas de juros. Isto gerou superávits da ordem de mais de R$ 70 bilhões. No entanto, nos últimos meses, a crise financeira deixou de ser um fenômeno internacional e produziu conseqüências para os agentes locais. A desvalorização dos ativos financeiros como ações, títulos de renda fixa e commodities, aliada à alta volatilidade (risco) de tais investimentos, fez com que os preços relativos se alterassem com freqüência, mudando as características das relações entre os mesmos.
Os fundos de pensão foram inevitavelmente afetados. Houve redução do valor das carteiras de ações e dos investimentos em carteiras de participação (conhecidos como private equity e venture capital), os fundos de pensão que investiram nos chamados fundos multimercado sofreram perdas representativas e houve aumento generalizado de riscos de crédito.
Estima-se que o patrimônio dos fundos de pensão no mercado internacional tenha se reduzido em até 20% do valor original no início de 2008. No Brasil, as perdas foram menores e mais concentradas. Embora não estejam disponíveis dados recentes da Secretaria de Previdência Complementar, estimamos que as perdas incorridas até a última semana de outubro são de 8% do patrimônio dos fundos e alcançariam cerca de R$ 34 bilhões. Muitos superávits obtidos ao longo dos últimos anos foram provavelmente transformados em déficits, a despeito do cuidado dos gestores. É de se ressaltar a atitude prudente dos gestores brasileiros que foram reduzindo as suas posições em ações ao longo do segundo semestre de 2007 e do primeiro semestre deste ano.
Diante dessa dura realidade representada pela atual crise financeira internacional, a atitude de um gestor de um fundo de pensão consiste em, prioritariamente, garantir a cobertura dos passivos existentes com o menor risco possível. Como o fundo de pensão não visa obter a maior rentabilidade, mas sim garantir o pagamento das pensões e aposentadorias, ele não deve correr riscos desnecessários que o leve em algum momento no futuro a apresentar déficits.
Os investimentos dos fundos de pensão devem observar as demandas de fluxo de caixa do passivo no médio e longo prazo, normalmente até mais do que 30 a 40 anos. Os principais riscos embutidos nessas análises dizem respeito ao risco de longevidade e ao próprio perfil do fluxo de caixa do passivo atuarial. O dimensionamento desses fluxos de caixa e de sua variabilidade com fatores demográficos e financeiros é etapa importante do processo de gestão de riscos de um fundo de pensão.
Por outro lado, os fundos de pensão devem possuir recursos disponíveis no curto prazo para fazer face às demandas do ano corrente. Neste caso, é necessário dispor de ativos financeiros que disponham de alta liquidez de mercado, suficiente para gerar os recursos necessários para o fundo.
É fundamental que a supervisão possa identificar antecipadamente deficiências na estrutura e no processo de gestão de riscos. Isso se aplica tanto à supervisão bancária como a dos fundos de pensão e, para estes últimos, é importante não apenas avaliar o lado do investimento, como a sua adequação ao perfil do passivo atuarial. Aqui não se trata de estabelecer um conjunto de restrições aos investimentos dos fundos de pensão e, sim, estabelecer que existam fundamentos sólidos que atestem a solidez dos investimentos e sua adequação ao perfil dos fluxos de caixa do passivo atuarial.
Em momentos de stress financeiro, é fundamental que os fundos de pensão não corram riscos desnecessários que não estejam diretamente ligados à sua obrigação precípua de pagar as aposentadorias e pensões devidas. Isso deve estar refletido nas suas políticas e no seu processo de investimentos. Nesses momentos, os fundos que possuem um melhor ajuste dos investimentos ao perfil do passivo devem correr menos riscos de insolvência e apresentar déficits menores. Por outro lado, em tempos de bonança, é permitido arriscar mais para se garantir uma maior folga no superávit do fundo, mas isso não qualifica necessariamente os gestores a buscarem uma maximização da rentabilidade.
Essa, por definição, não é seu objetivo final, pois rentabilidade de curto prazo não significa menor risco de insolvência no futuro. (Cláudio Paiva e José Roberto F. Savoia – Valor Online)
Fonte:AssPerviSite
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